quinta-feira, outubro 04, 2007

Dos Pigmeus aos homúnculos

«Quanto à frase, ou expressão de desejo, que "antes Afonso XIII do que Afonso Costa", se a acho (seja ela de quem for) absurda e abjecta, confesso que a compreendo, que compreendo que se houvesse emitido. Aqui - como no caso de Couceiro - os conceitos, que expus, acerca do que constitui uma Pátria devem auxiliá-lo a compreender também. O domínio espanhol significaria um grande desgraça, uma grande vergonha, e um grande desastre nacional. Era a perda da nossa independência - não é assim? - o arrazamento da Pátria? Mas que diabo é isto em que vivemos? Vivemos como portugueses? Como vivemos, se não somos governados por homens orientados portuguesmente? como, se são estrangeiras as ideias que nos "orientam"? como, se de independência nacional temos apenas o nome e o espectro da cousa? Para que serve uma independência nacional, se não é para se viver nacionalmente? Que diabo de independência nacional tem um desgraçado país que é internacionalmente um feudo da Inglaterra, que é nacionalmente um feudo do anti-português Afonso Costa? Se a perda declarada da nossa independência seria ( e sê-lo-ia) uma desgraça e uma vergonha, em que é (salvo na absoluta evidência exterior) menos vergonha e menos desgraça a triste situação em que estamos? Um Portugal onde internacionalmente só se pode ser inglês; onde nacionalmente só se pode ser francês (pois que francesas sejam as ideias republicanas que nos "governam") - um Portugal onde, portanto, tudo se pode ser ("tudo" é um modo de falar) menos português, que espécie de "Portugal independente" é que é? Que independência há nisto? Triste gente que se contenta com a triste aparência das cousas, e não vê um palmo adiante das sensações quotidianas, para dentro da sua alma súbdita e oprimida!»


- Fernando Pessoa, "Da República"

No início destes textos socio-políticos, Fernando Pessoa começa por avisar: "Aqueles portugueses do futuro, para quem porventura estas páginas encerrem qualquer lição, ou contenham qualquer esclarecimento, não devem esquecer que elas foram escritas numa época da Pátria em que havia minguado a estatura nacional dos homens e falido a panaceia abstracta dos sistemas."

Fernando, caro mestre, apesar de tudo, sorte a tua em não assistires à liliputização em que vamos!... Comparados aos homúnculos de importação desta hora eram gigantes os pigmeus estrangeirados do teu tempo.

E repito a pergunta: Um Portugal onde se quer ser tudo menos português, que dignidade há nisto?
Por todo o lado grassa um apetite descomunal, olhos e panças alucinantes arrastando por um cordel alminhas em miniatura.

1 comentário:

Anónimo disse...

Este fernando era franzino mas tinha uma clarividência do caraças!!!