quarta-feira, outubro 29, 2008

Do Ghetto ao Globo - II. O Nascimento do Banksterismo

«A economia da Europa pós-napoleónica estava em grande parte centralizada nos esforços de vários países para fazerem sangrar os recursos financeiros internos; isto é, pôrem a flutuar empréstimos nacionais. Aqui os Rothschild, com o seu imenso capital novo, encontravam-se sem um ponto de apoio.
Só a minúscula Prússia os deixou negociar um empréstimo. A Áustria, a taluda, preferia companhia mais elegante. A sua corte antiquada alimentava-se de precedentes e formalidades.(...)
Em França a situação parecia ainda pior. Aqui, Luis XVIII tinha literalmente pedido emprestado o esplendor da restauração dos Bourbon, a Nathan e James Rothschild. Tinham-lhe adiantado saques britânicos para financiar a sua imponente entrada em Paris. Mas isso passara-se em 1814, quando os tiros de canhão eram ainda uma recordação palpável. Agora, três anos depois, os velhos banqueiros aristocráticos tinham regressado, dando ordens dos seus salões. Comparado com eles, qualquer gesto dos Rothschilds parecia um ruído muito impertinente.
O novo governo francês preparava um grande empréstimo, de 350 milhões de francos, e confiou-o a Ouvrard, um distinto nome financeiro francês, e aos irmãos Baring, banqueiros ingleses da moda. Para eles os filhos de Mayer eram "simples troc-moedas". O empréstimo, sem os Rothschild, foi um grande êxito.
Em 1818 começaram as negociações para uma emissão adicional de 270 milhões de francos. De novo Ouvrard e Baring iam à frente; os Rothschilds continuavam a frequentar inutilmente o Ministério das Finanças. Este empréstimo, contudo, era para liquidar a indemnização de guerra francesa. A sua disposição final realizar-se-ia numa conferência com os países vitoriosos em Aix-la-Chapelle.
Na história da família, o esquecido congresso de Aix é um ponto mais importante do que o ainda notável exclusivo de Waterloo. Aix marcou a primeira acareação social entre o grande mundo e os recentemente grandes Rothschilds. Começou com uma roda de banquetes e "soirées" à moda do Congresso de Viena, com os Rothschilds fascinados e gelados lá fora, como crianças pobres diante de uma montra de Natal iluminada. Atingiu o seu auge com um trovão furioso. E quando o estrondo diminuiu, as "crianças" tinham-se apoderado da loja.
Ninguém previu este resultado durante a primeira semana, possivelmente nem mesmo Salomão e Kalmann, que estavam presentes como representantes da família. Para começar, a Inglaterra enviara Lord Castlereagh, em vez de John Herries, o seu velho amigo. Salomão e Kalmann deviam ter-se sentido perdidos num mundo tão sobrecarregado de protocolo antiquado, com elogios tão enviesados. O seu "habitat" natural era a Bolsa, e não a sala de baile.
No entanto os alfaiates mais caros tinham-lhes fornecido coletes e gravatas dos melhores tecidos. As suas carruagens brilhavam. Os cavalos reluziam. Que importância tinha o facto de a sua gramática ser um pouco primitiva? Além disso Kalmann acabara de casar com Adelheid Herz, da família hebraica mais soignée da Alemanha. A noiva encabeçaria o "bon ton" da família.
Porém não serviu de nada. Sempre que os irmãos queriam falar com o Príncipe Metternich, este estava a ser recebido pelo Duque de Richelieu. Lord e Lady Castlereagh não se encontravam em lugar nenhum, pois andavam sempre a passear com o Príncipe Hardenberg. Os Rothschilds não eram incluídos em nenhuma destas reuniões. Baring e Ouvart, os seus rivais, pareciam tomar parte em tudo.
Só os secretários estavam disponíveis, e os secretários sorriam com frieza: Sim, as negociações com Baring e Ouvrard encaminhavam-se para uma conclusão. Para quê mudar de parceiro a meio da valsa? As obrigações do empréstimo de 1817 não estavam naquele momento a subir na Bolsa de Paris?
Os Rothschilds decidiram tentar mais uma vez. Completaram a compra de Friedrich von Gentz, um brilhante publicista, amigo de Metternich, e peralvilho do congresso. Compraram David Parish, um jovem banqueiro elegante, que se gabava de boas relações com Baring. Compraram todas as graças sociais vendáveis. verificaram e tornaram a verificar se as suas calças e sobrecasacas e as librés dos criados estavam impecáveis. Tudo estava em ordem.
Nada deu resultado. Nos salões as pessoas divertiam-se com o aspecto intrigado de Kalmann, com as expressões carrancudas de Salomão. No meio do divertimento geral passou despercebida outra circunstância: os correios que entravam e saiam da residência dos irmãos, com frequência crescente.
Todo o mês de Outubro de 1818 Aix fez salamaleques, pulou, passeou e ignorou a existência daqueles tolos dos Rothschilds. A 5 de Novembro aconteceu uma coisa estranha. As obrigações do governo francês, o famosos empréstimo de 1817, começaram a descer, depois de subirem continuamente durante um ano. Dia após dia desciam cada vez mais. E não era apenas isso - outros papéis também oscilavam. Do céu azul rebentavam tempestades. Estava à vista um "crash", não só em Paris, mas nas Bolsas de toda a Europa.
A música parou em Aix. Os cavalheiros nobres estavam como que encadeados no esplendor subitamente interrompido. É que, no fim de contas, tinham-se feito uns empregozitos de capital.
Os príncipes é que mostravam agora expressões carrancudas, ao passo que - caso curioso! - Kalmann e Salomão sorriam. Um rumor fez estremecer os salões. Teriam aqueles Rothschilds...
Aqueles Rothschilds tinham... Com as suas reservas ilimitadas tinham comprado durante semanas, as obrigações emitidas pelos rivais, especulando com o papel, comprando secretamente em grandes quantidades. E depois, num gesto impiedoso, tinham lançado no mercado tudo o que tinham adquirido. Através de todo o continente os alicerces das finanças gemiam. A alta sociedade sabia agora o que significava recusarem reconhecer um Rothschild.
Metternich, o Duque de Richelieu, o Príncipe Hardenberg fizeram o que havia a fazer. Seguiu-se uma entrevista séria entre eles e Ouvrard e Baring, em cujo novo empréstimo (ainda por nascer), eles tinham já reservado quantias por sua conta própria. Falaram; separaram-se; o empréstimo projectado desfez-se em nada.
Então, Salomão e Kalmann foram convocados e -pasmai! - os seus trajos eram agora a última moda, o seu dinheiro o mais precioso para quem o pedia emprestado.»

- Frederic Morton, "Os Rothschilds"

terça-feira, outubro 28, 2008

Do Ghetto ao Globo

É uma 1ª edição de 1963 e encontrei-a numa das minhas voltas pelas alfarraburas. Refiro-me à tradução portuguesa de "Os Rothschilds", de Frederic Morton. A história é escrita em tom apologético, sob o beneplácito da Família, mas não está mal escrita, a tradução recomenda-se, e lê-se com bastante agrado. Deve ainda realçar que, em meu entender, são geralmente mais esclarecedoras e sugestivas estas obras apologéticas, laudatórias, até triunfais, que os seus inversos.
Em homenagem a esta crise actual, beirabunda de sabe Deus o quê, que, dizem, a economia planetária atravessa, julgo da maior pertinência postar algumas passagens desta feérica e fulminante saga. Farei apenas transcrições, sem quaisquer comentários meus. Limitar-me-ei ao título da série: "Do Ghetto ao Globo", porque descreve exactamente a ascensão. Mas vamos ao que interessa...

«A batalha de Waterloo estabeleceu a Inglaterra como a maior força europeia. Para os Rothschild, seus principais agentes financeiros, Waterloo representou uma "caixa" no valor de muitos milhões de libras. A fama desse golpe enfeitou-a, em anos posteriores, com pombos correios e outros acessórios lendários. Mas, como a maioria dos feitos da família, baseou-se em trabalho muito árduo e em astúcia muito fria.
O trabalho começara há muito tempo. Logo que os rapazes saíram de Francfort e se espalharam pela Europa, tinham começado a enviar uns aos outros, afadigadamente, interminavelmente, tópicos de interesse comercial ou geral. Não tardou que surgisse um serviço de notícias privado. (Na Casa de Londres manteve-se até à 2ª guerra Mundial, sob a forma de uma dúzia de Correios vestidos de azul, prontos a partirem, de um momento para o outro, para o Rio, Melbourne ou Nairobi).
As carruagens dos Rothschild corriam pelas estradas; os barcos dos Rothschild atravessavam o Canal da Mancha; os mensageiros dos Rothschild eram sombras ligeiras que deslizavam pelas ruas. Transportavam dinheiro, títulos, cartas e notícias. Principalmente notícias - as últimas notícias exclusivas que iam ser vigorosamente processadas nas Bolsas de Títulos e de Mercadorias.
E não havia notícia mais preciosa do que o resultado de Waterloo. Durante dias e dias a Bolsa de Londres tinha arrebitado as orelhas. Se Napoleão ganhasse, as consolidadas inglesas sofreriam uma grande baixa. Se perdesse, o império inimigo despedaaçar-se-ia e as consolidadas subiriam.
Durante trinta horas o destino da Europa esteve pendente, envolto em fumo de canhão. A 19 de Junho de 1815, ao fim da tarde, um agente dos Rothschild saltou para um barco em Ostende. Na mão levava uma gazeta holandesa ainda húmida de tinta. Ao alvorecer de 20 de Junho, Nathan Rothschild, no porto de Folkstone, percorria com os olhos os primeiros parágrafos das notícias. Um momento mais tarde ia a caminho de Londres (batendo o mensageiro de Wellington por muitas horas de avanço), para dizer ao governo que Napoleão fora aniquilado. Depois dirigiu-se para a Bolsa.
Outro homem na sua posição teria convertido todo o seu dinheiro em consolidadas. Mas este homem era Nathan Rothschild. Encostou-se à "sua coluna". Não investiu. Vendeu. Vendeu a preços muito baixos.
O seu nome era tal que um único gesto substancial da sua parte era o suficiente para fazer descer ou subir uma emissão. As consolidadas desceram. Nathan continuava encostado, e vendia e tornava a vender. As consolidadas desceram ainda mais. - O Rothschild lá sabe, - murmurava-se pela Bolsa- Waterloo está perdido.
Nathan continuava a vender, o rosto redondo, imóvel e severo, os seus dedos grossos afundando o mercado em dezenas de milhares de libras, a cada sinal de venda que faziam. As consolidadas iam a pique, as consolidadas iam ao fundo - até que, um segundo antes de ser demasiado tarde, Nathan de repente comprou uma quantidade gigantesca por dez réis de mel coado. Passados uns momentos estalava a grande notícia, que fazia com que as consolidadas subissem muito alto.
Não podemos adivinhar o número de esperanças e pecúlios desfeitos com este pânico preparado. Não podemos calcular quantos criados de libré, quantos Watteaux e Rembrandts, quantos cavalos puro-sangue dos estábulos dos seus descendentes, foram ganhos pelo homem encostado à coluna da Bolsa, nesse dia.»

segunda-feira, outubro 27, 2008

Celebridade e multidão

«Todo o homem que merece ser célebre sabe que não vale a pena sê-lo. Deixar-se ser célebre é uma fraqueza, uma concessão ao baixo-instinto, feminino ou selvagem, de querer dar nas vistas e nos ouvidos.»
- Fernando Pessoa

«Ao contrário das catástofres, Deus não aprecia multidões.»
- César Augusto Dragão

No grego, o verbo chelew significa seduzir (com o canto ou por qualquer arte), encantar, mas também corromper. Posteriormente, no latim, "celeber" significará "frequentado", "festejado", de que se fala muito", "célebre", "numeroso", "abundante". Dai provirá o nosso "célebre".
O célebre é assim, não custa lobrigá-lo, aquele que seduz a multidão, aquele que a multidão festeja, aclama e frequenta, em suma, o encantador de multidões. O enlevo ou entertainer das massas. O truão da cegada.
Entretanto, a multidão, que os gregos denominavam "ochlos", já repugnava ao bom Jesus. A cada passo vêmo-lo a afastar-se dela, a retirar-se sozinho para os olivais. O número não o seduz nem fascina lá muito. Mesmo o bando de apóstolos, ora pusilânime, ora sonolento, merece-lhe algum cepticismo lúcido. Atravessa a turba e o tumulto como atravessa as águas indiferenciadas e revoltas do lago Tiberíades: caminhando enxuto por sobre aquilo tudo.
Sair daqui enxuto, isto é, não lambuzado pela turba. Acreditem-me: meta de vida mais nobre não conheço.



domingo, outubro 26, 2008

Esquisitice

Dois antropófagos amazónicos tinham acabado de caçar um missionário jesuíta. Estavam agora a pitá-lo, quando, perto dali, avistaram um terceiro canibal que passava...
-"Olha! Não é o teu primo Tapuri?" - Exclamou um deles.
-"É." - Respondeu o outro.
-"Então, e não o convidas para a petiscada? É bem gordinho este padre, chega bem para três."
-"Pois, de facto. Mas o meu primo não come padres."
-"Não come padres?!!" - Assombrou-se o primeiro. - Não me digas que deu em vegetariano!..."
-"Não. Só come rabis. Diz que é um canibal Koscher."

sábado, outubro 25, 2008

Brincar às casinhas (rep.)

Sobre este frenesim das bichonas, escuso de me repetir, no essencial. Basta repor o que já aqui declarei há uns anos, com duas pequenas actualizações (desde então, apenas as eleições e o tsunami mudaram de vítimas)...


A juntar às eleições nos Estados Unidos, ao Tsunami nas metafinanças e ao Holocausto da Segunda Guerra Mundial, outro dos grandes problemas nacionais, dos mais prementes e prioritários na agenda política, é a adopção de crianças por casais homossexuais. Começo por dizer que não entendo, não é compreensível sequer, que os homossexuais sendo tão avançados, tão liberabundos, afrontando tão visceralmente a sociedade num dos seus núcleos fulcrais (a própria família biológica –e que eu saiba, não há outra), se tenham depois contentado com aquela farsazinha burguesa do casal. O maridinho e a esposa, a esposa e o maridinho, quiçá por turnos, numa monogamia tão rançosa quanto a dos piores burgueses de Stendhal. Para cúmulo, como se essa paródia grotesca já não bastasse, agora reclamam o resto dos acessórios, a filharada em comitiva, de lacinho e chapéu, para irem todos -muito dignos e apessoados - à missa, ao domingo. Antes disso, e depois também, é mais que certo que tratarão de mover o céu e a terra de modo a obrigar os padres a casá-los, a baptizar-lhes os fedelhos adoptivos, a dar-lhes catequese, e a ouvi-los –a todos, aos cabrões dos putos e aos estafermos dos pais – em confissão semanal. Menos que isso, ó da guarda, que é discriminação. Uma miséria, enfim! Mandá-los a todos para o caralho seria redundante.
Mas, isto do "casal" intriga-me. De facto, porquê casal homossexual? Porque não trio, quarteto, quinteto, caterva, centúria ou, como até bem mais emblemático seria, comboio ou sanduiche? Porque carga de água se lembraram de arremedar a famelga tradicional, estúpida, obsoleta, e não o grupo de jazz, a tuna académica ou o expresso transcontinental? Porquê uma monogamia a todos os títulos gasta, nas vascas, e não uma poligamia, ou poliandria, ou policongresso itinerante? Como quereis que vos levem a sério, ó bichonas, com essas parelhazinhas de imitação, de pechisbeque, de pacotilha? Casal por casal, o juiz, que não é parvo nenhum, entrega o desgraçado do órfão aos burgueses tradicionais, caga-se nos peregrinos. E acho muito bem. Mal por mal, antes aquele que já se conhece e contra o qual já existe legislação. Agora imaginem: “Quarteto homossexual”, “comboio homossexual”...
É catita, não? O meirinho anunciava: “meritíssimo, está lá fora um “comboio homossexual” que pede para adoptar uma criança, de preferência menino!” Aqui, o juiz, no mínimo, impressionado pelo número, hesitava, suspendia na balança e era forçado a admitir que vinte, ou duzentos (fora os contactos, as liaisons), sempre pesam mais que dois. Mesmo um quarteto ou quinteto, um trio que fosse, já acrescentavam qualquer coisa. Já o levavam a pensar duas vezes. Já o punham a fazer contas de cabeça, a extrair raízes quadradas, co-senos e algoritmos. Nestes nossos dias, a contabilidade é preciosa, vale muito, avassala as mentes. É preponderante. Agora assim, vão duas avantesmas amaneiradas, a cavalo num livro de cheques, de braço dado, e o que é que o meirinho murmura ao juiz? “meritíssimo, estão ali fora duas bichonas, armadas em barbies chocas, a pedirem criancinhas para irem brincar às casinhas!” Em resumo: um casal homossexual, gay, ou o que lhe queiram chamar, não é digno de adoptar crianças porque é uma anedota de mau gosto, uma bimbalhice abaixo de cão, mais digna até de dó e cuidado clínico que propriamente de apedrejamento ou invectiva. E se a inteligência e o conhecimento são limitados, a estupidez também deveria sê-lo. Urgentemente. Até por uma questão de higiene e saneamento básico. Quando não, é a própria sanidade mental das sociedades que entra em colapso. Porque em degradação consumptiva anda ela há muito tempo.

Cassandras ao desbarato

Perguntado sobre o que de mais injusto lavra no país, o cidadão avulso não hesita: a Justiça; inquirido sobre o que de mais desgovernado, impestenejante, dispara: o Governo; interrogado sobre o que de mais errático, grosseiro e analfabeto, nem vacila : a Educação. E o restante vai pela mesma tabela... O mais doente? A Saúde. O mais mentiroso? A Informação. O mais vulgar e rasteiro? As Elites. O mais delapidador? A Economia & Finanças. O mais imundo? A Asae.

É todo um país virado do avesso. A berrar pelas costuras. Mas o mais sintomático é que não estamos perante mero paleio de táxista. O problema é que a realidade escorreu e liquefez-se num sórdido charco de absurdo cada vez mais alucinante. Já não são apenas simples verbos delirantes que vão ao volante de táxis: são Cassandras. À realidade, os politólogos, pantósofos e analistas lambuzam-na, quando não estão de pata alçada nela; eles, todavia, os outrora tresloucados motolálios, doravante chocalhantes de lucidez, proferem-na.
Ressalta uma, entre muitas evidências: Não foi só a completa noção de higiene mental básica que o país perdeu; foi a inteira noção de ridículo.

segunda-feira, outubro 20, 2008

Finanssauros Rex



«JPMorgan Responsible for the Destruction of U.S. Financial System»

Todo um vórtice em acção...

«JPMorgan is a monster predator at work, hidden from view...»

Mas "escondido das vistas" só se for mesmo dos ceguinhos e pataratas. Está bem que é a generalidade da população, mas ainda assim...

domingo, outubro 19, 2008

Purga com justa causa

Aproveitando a onda de purga democrática em que a blogosfera, sempre tão devotamente, surfa, sinto-me tentado a expulsar deste blogue o Engenheiro Ildefonso Caguinchas. Ele, segundo me confessou há bocadinho, também se debate em ânsias de correr comigo a pontapés o quanto antes. Mais que divergências acerca da linha editorial - que, como todos sabem, ora prima pela inexistência, ora lucila pela cornucópia-, anima-nos uma esperança galifona e doravante não mais secreta: que o vencedor, democrata redimido e recauchutado, receba como prémio o convite para participar no Corta-Fitas. Onde substituirá, com garantida vantagem, o deposto Paulo Cunha Porto, não na escrita (até porque promete de antemão não escrever), mas, isso sim, todos os dias (domingos e feriados inclusivé) no ronroneio e assédio galante à donzela em epígrafe.
Aliás, se for eu o felizardo, como bem espero, levo comigo um bónus acrescido: falo francês. (O Paulo, estou em crer, também falava, mas não com a guturalidade cavernosa que é apanágio cá da espécie).

Venha a higiene!

«Os agiotas da Bolsa esganiçam-se agora a filosofar acerca da humanidade..., que para muitos deles não passa de um negócio. Porque, na realidade, sem a guerra, pode acontecer que se derramasse ainda mais sangue. Acreditai-me, em não poucos casos, se não em todos, - prescindindo das guerras civis -, é a guerra um meio de alcançar com um mínimo de efusão de sangue, de dor e de rasgos de energias a paz internacional e de estabelecer, quanto mais não fosse aproximadamente, relações normais entre os povos. Claro que é triste que assim seja; mas assim é. Mais vale acabar de uma vez à espada que sofrer dores intermináveis. E em que é preferível à guerra a paz actual entre as nações civilizadas? Pelo contrário, muito mais do que a guerra, animaliza o homem a paz duradoura, tornando-o cruel. Porque uma longa paz gera sempre vulgaridade, cobardia, um egoísmo cru e ácido e sobretudo... inércia espiritual. Nas épocas de prolongada paz só engordam os exploradores do povo. É crença geral que a paz produz riqueza... Mas isso apenas para a décima parte dos mortais. E essa décima parte, que não tarda a contagiar-se das enfermidades da riqueza, comunica-lhes, naturalmente, essas doenças às nove partes restantes, claro que sem a riqueza. Mas adoece de corrupção e de cinismo. Como resultado de a riqueza se acumular nas mãos de alguns poucos, os sentimentos desses embotam-se até raiar pela estupidez. O sentimento de distinção converte-se em manifestações de anormal ousadia e de anormalidades caprichosas. A voluptuosidade gera crueldade e cobardia. A alma grosseira e ébria do voluptuoso é mais cruel que a do próprio vicioso. Voluptuoso que desmaia diante de um dedo cortado é capaz de não perdoar a um pobre diabo uma dívida insignificante, pondo-o, tranquilamente, à sombra. Mas a crueldade gera uma preocupação meticulosa, cobarde, com a segurança própria, que, com o tempo, numa paz duradoura, se converte em angústia quase mórbida, a qual acaba por penetrar em todas as camadas sociais, provocando a mais tremenda ambição do dinheiro.»

- Dostoievski, "Diário de um escritor"

Dizia Nietzsche que "a guerra é a higiene dos povos". Nos últimos séculos, porém, tornou-se uma negociata suja de agiotas, um autêntico jacuzzi de pocilga. Pelo que, num sentido íntimo, actualmente, nem se diferenciará muito da paz. Ambas servem os mesmos interesses, ambas ordenham a mesma gadeza repugnantemente horizontal e suinocéfala. Que lhes faça bom proveito. Por mim, continuo imune às subtilezas destes progressos agro-pecuários. Permaneço um nostálgico incurável e empedernido duma boa guerrazinha à moda antiga. De um daqueles ginásios daquilo que os gregos apelidavam - com infinita justeza - de "andros". Ou seja, o viril.
A esta transumância burgueza, a toque de mamon, façam-me um favor: não lhe chamem civilização. Soa obsceno. Chamem-lhe castração & esterilização Inc. Do corpo, do espírito e dos sonhos.
E das duas uma: ou tomamos banho, ou ficamos à espera que nos varram daqui. Pois num tempo em que cada vez mais nos adestramos na separação do lixo e em que cada vez menos nos separamos e distinguimos dele, este, temo bem, será, mais dia menos dia, o destino fatal.

sábado, outubro 18, 2008

Jeff Beck - A day in the life (Beatles)

No meu modesto entender, o maior guitarrista do rock.

quinta-feira, outubro 16, 2008

Haia com Deus!...

Um senador americano, do estado do Nebraska, apresentou queixa em tribunal contra Deus. Não é brincadeira. Aconteceu mesmo. O Todo Poderoso foi destemidamente processado por terrorismo contra os habitantes de Nebraska e os indígenas do planeta Terra em geral. De caminho, Ernie Chambers, o queixoso, requereu uma providência cautelar contra O Lá-de-Cima, de modo a impedi-lo de prosseguir com as seus reiterados abusos, ilegalidades e perfídias antropofóbicas. O Juiz federal a quem, em primeira instância, coube avaliar o caso, lamentavelmente, não foi lá muito sensível às razões do demandante: mandou arquivar o processo por desconhecimento absoluto do paradeiro domiciliar do arguido, acrescido da impossibilidade concomitante de lhe fazer chegar, em tempo útil, a notificação legal.
Entretanto, irredutível, o queixoso ameaça apelar. Argumentando, não sem alguma lógica, omnisciência reconhecida da parte do criminoso.
Não vou discutir aqui a pertinência da demanda. Direi apenas que o foro me parece, de todo, desadequado. Para os alegados crimes em questão, o queixinhas deverá dirigir-se a Haia.

PS: Em todo o caso, sempre parece menos estúpido proceder-se contra alguém que não sabemos onde mora do que contra alguém que garantimos, a pés juntos, nem sequer existir.

terça-feira, outubro 14, 2008

quarta-feira, outubro 08, 2008

US Economy Collapsing

Um vídeo altamente instrutivo.

Otárius ininterruptus


Pobres otários... Ainda nem tinham acabado de pagar o défice interno e já os albardam para alombarem com a crise global!...

terça-feira, outubro 07, 2008

A vanguarda

Em "MacBeth", escreve Shakespeare a dado passo:
« - E que é ser traidor?
- Faltar à palavra e juramento.
- A isso chama-se traição?
- E quem a pratica merece ser enforcado.
- Todo aquele que a pratica?
- Todos.
- E quem os enforcará?
- As pessoas honradas.
- Então bem tolos são os traidores, pois sendo tantos parece que deveriam ser eles a enforcar a gente honrada.»
E depois viviam a expensas de quem? (poderia acrescentar eu, pensando e transpondo para esta nossa lusa actualidade)...

A traição, aliás, tem por hábito mascarar-se de vanguarda. Dito à maneira da esquerda. Na direita, chamam-lhe elites. A mesma bosta com embalagens diferentes. A forma como o nosso saudoso D.João II tratou da elites deveria ter constituído paradigma e farol para a posteridade.

domingo, outubro 05, 2008

Dia de Nojo



«Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,
Define com perfil e ser
Este fulgor baço de terra
Que é Portugal a entristecer -
Brilho sem luz e sem arder,
Como o que o fogo-fátuo encerra.

Ninguém sabe que coisa quer,
ninguém conhece que alma tem,
Nem o que é mal nem o que é bem
(Que ânsia distante perto chora?)
Tudo é incerto e derradeiro.
Tudo é disperso, nada é inteiro.
Ó Portugal, hoje és nevoeiro...

É a hora!»

- Fernando Pessoa, " Mensagem"

Culinária Legal

Acompanhemos o evoluir duma cavilação através do labirinto jurídico...

No Decreto-Lei 48/95 podia ler-se:

Artº 240 - Descriminação racial

1. - Quem:
a) fundar ou constituir organização ou desenvolver actividades de propaganda organizada que incitem à discriminação, ao ódio ou à violência raciais, ou que a encoragem; ou
b) participar na organização ou nas actividades referidas na alínea anterior ou lhes prestar assistência, incluindo o seu financiamente;
é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.

2 - Quem, em reunião pública, por escrito destinado a divulgação ou através de qualquer meio de comunicação social:
a) provocar actos de violência contra pessoas ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor ou origem ética; ou
b) Difamar ou injuriar pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor ou origem étnica;
com a intenção de incitar à discriminação racial ou de a encorajar, é punido com pena de prisão de 6 meses a 5 anos.

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Pois bem, três anos depois, através da Lei 68/98, o mesmo artº 240 enriquece-se com o acrescento da discriminação religiosa à racial, passando a rezar do seguinte jaez:

Artº 240 - Discriminação racial ou religiosa

1 - Quem:
a) Fundar ou constituir organização ou desenvolver actividades de propaganda organizada que incitem à discriminação, ao ódio ou à violência raciais ou religiosas (...)
2 - Quem, em reunião pública, por escrito destinado a divulgação ou através de qualquer meio de comunicação social:
a) provocar actos de violência contra pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor, origem étnica ou nacional ou religião; ou
b) Difamar ou injuriar pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor, origem étnica ou nacional ou religião, nomeadamente através da negação de crimes de guerra ou contra a paz e a humanidade (...)

_________ //__________________

E, finalmente, no ano transacto, chega-se à redacção actual, por via da Lei 59/2007:

Artº 240 - Discriminação racial, religiosa ou sexual

1. - Quem:
a) Fundar ou constituir organização ou desenvolver actividades de propaganda organizada que incitem à discriminação, ao ódio ou à violência contra pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor, origem étnica ou nacional, religião, sexo ou orientação sexual, ou que a encorajem (...)
................ .......................
2 - Quem, em reunião pública, por escrito destinado a divulgação ou através de qualquer meio de comunicação social ou sistema informático destinado à divulgação:
a) Provocar actos de violência contra pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor, origem étnica ou nacional, religião, sexo ou orientação sexual; ou
b) Difamar ou injuriar pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor, origem étnica ou nacional, religão, sexo ou orientação sexual, nomeadamente através da negação de crimes de guerra ou contra a paz e a humanidade; ou
c) Ameaçar pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor, origem étnica ou nacional, religião, sexo ou orientação sexual;
com a intenção de incitar à discriminação racial, religiosa ou sexual, ou de a encorajar, é punido com pena de prisão de seis meses a cinco anos.


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Esta informação foi-me fornecida por um ilustre contertúlio, homem de leis, a quem daqui envio os meus agradecimentos e homenagens.
Penso que a clareza da receita, os seus temperos, molhos e tempos de confecção ressaltam bem patentes do próprio texto, nos seus meandros evolutivos, e dispensam ulteriores comentários. Fica o alerta. É sempre bom sabermos das linhas com que nos cosem... as beiças.

sábado, outubro 04, 2008

O Panihilismo

O capitalismo está onde sempre esteve: falido; e o Mercado é uma fantasia que alguns papagaios de serviço teimam em investir com os atributos de divindade omnisciente e omnipotente. Notem que quando eu digo "o capitalismo" quero tudo menos significar o "sistema capitalista". "Sistema capitalista" constitui um dos maiores oximoros ao cimo deste planeta de otários. Colocar "sistema" e "capitalismo", mais que na mesma frase, no mesmo conceito, equivale a reunir na mesma solução a água e o azeite. O réptil e a ave. Quando refiro "capitalismo" designo, pois, a realidade e não a quimera.
O Capitalismo, dito com propriedade, consiste, desde sempre, numa multiplicidade de esquemas sob um denominador comum: lucro. Sendo que a característica intrínseca e régia dessa multiplicidade é a ausência de freio ou limite, seja em termos éticos, seja em termos políticos, seja, ainda mais, em termos estritamente económicos. Essa, de resto, é a sua tendência motora permanente e obsidiante: o demandar sempre mais e mais, numa lógica bruta, fria e cega de pura acumulação. No capitalismo - a que o maquiavelismo serve, em simultâneo, de pajem e cábula - nem a moral, nem a sistematização são para ali chamados. Ou não tivesse resultado, tal aventesma, precisamente da ausência quer de moral, quer de sistema. Ou não germinasse, tamanho aborto, precisamente duma falência: a da civilização europeia.
Por isso, investi-lo de qualquer sistema, moral, finalidade, princípio ou, pior ainda, ideologia, só não raia a bacoquice porque, em bom rigor, a ultrapassa a galope. O capitalismo não cumpre ideologias, receitas nem programas: excede-os. Dizendo melhor: serve-se deles. Conferir-lhe qualquer uma dessas roupagens putativas é atribuir-lhe limites ou definições, ou seja, é mascará-lo e cobri-lo daquilo que ele, de facto, não é.
Assim, a ideia de que há um capitalismo benigno e um capitalismo selvagem é, sem sombra de dúvida, dos delírios mais tansos que me foi dado assistir nesta vida. Mais que alheamento, requer aturdição. É como dizer que o crocodilo se comporta pessimamente à solta num rio, mas devém óptima companhia uma vez confinado às paredes duma piscina pública ou tanque municipal.
No entanto, concorrendo em paralelo com esta perspectiva delirante, existe e persiste, anedoticamente, uma outra ainda mais cómica: a de, pelos mais diversos meios e fórmulas peregrinas ou dissolventes, querer destruir o capitalismo. É como querer destruir a destruição, arruinar a ruína, corroer a corrupção ou desmantelar o caos. É como combater corpo a corpo contra areias movediças. O capitalismo agradece. Depois de, geralmente, ter promovido, pago e agenciado.
Por conseguinte, nesse sentido paradoxal, o capitalismo é inatacável e indestrutível. Não se combate, não se desmonta, nem se derruba. Requer, outrossim, alguns procedimentos básicos de abordagem, de que saliento apenas dois, ambos indispensáveis: tanto quanto inalar, evitar pisar-se. Pois tão perigosa quanto a sua toxicidade, só mesmo a sua peganhentice.

quinta-feira, outubro 02, 2008

Vasos comunicantes

«The business of taking deposits and lending by banks had been split during the Great Depression from the business of underwriting and selling stocks and bonds—investment banking—by an act of Congress, the Glass-Steagall Act of 1933. The law was passed amid the collapse of the banking system in the United States following the bursting of the Wall Street stock market bubble in October 1929.
That Glass-Steagall act was a prudent attempt by Congress to end the uncontrolled speculative excesses of the Roaring Twenties by New York finance. It established the Federal Deposit Insurance Corporation to guarantee personal bank deposits to a fixed sum that restored consumer confidence and ended the panic runs on bank deposits.
In November 1999, after millions spent lobbying Congress, the New York banks and Wall Street investment banks and insurance companies won a staggering victory. The US Congress voted to repeal that 1933 Glass-Steagall Act. President Bill Clinton proudly signed the repeal act with Sandford Weill, the chairman of Citigroup.
The man whose name is on that repeal bill was Texas Senator Phil Gramm, a devout advocate of ideological free market finance, finance free from any Government fetters. The major US banks had been seeking the repeal of Glass-Steagall since the 1980s. In 1987 the Congressional Research Service prepared a report which argued the case for preserving Glass-Steagall. The new Federal Reserve chairman, Alan Greenspan, just fresh from J.P. Morgan bank on Wall Street, in one of his first speeches to Congress in 1987 argued for repeal of Glass-Steagall

Justice for all

«Banquo - It will be rain tonight.
First Murder - Let it come down.»
- Shakespeare, "Macbeth"

«Ten reasons not to bail out Wall Street.»

A Bolsa ou a vida!...

Se não lhes derem imediatamente (e para começar, porque depois novas exigências se seguirão) o dinheiro que eles exigem, podemos, desde já, ir antecipando alguns dos efeitos devastadores daí decorrentes:
-«Petróleo pode recuar para os 50 dólares em caso de recessão mundial».

Mas, afinal, estão a ameaçar-nos ou a seduzir-nos?...

Se bem que, após toda esta recente farsa do "crash de faz-de-conta", alguém levar ainda a sério previsões, prognósticos, augúrios ou o que quer que seja destes gangsters financeiros só mesmo por tonhura grosseira, hirsuta, relapsa e obsessiva.

quarta-feira, outubro 01, 2008

O Crime compensa

«Wall Street Executives Made $3 Billion Before Crisis »

«Merrill Lynch & Co. paid its chief executives the most, with Stanley O'Neal taking in $172 million from 2003 to 2007 and John Thain getting $86 million, including a signing bonus, after beginning work in December. The company agreed to be acquired by Bank of America Corp. for about $50 billion on Sept. 15. Bear Stearns Cos.'s James "Jimmy'' Cayne made $161 million before the company collapsed and was sold to JPMorgan Chase & Co. in June.»